José Luis Rivera: o chef que viaja pela Colômbia para resgatar as memórias vivas da culinária tradicional.

Quando José Luis Rivera fala de fogo, não se refere a uma técnica culinária. Fala do coração das cozinhas rurais, daquele calor que não só ferve, mas une, como uma brasa que nunca se apaga em meio às terras que percorre.
Em sua voz há memória, há terra, há campo. Mas também há cidade. Ele nasceu em Chía, Cundinamarca, quando ainda era uma cidade de pastos, domingos de sancocho à beira da estrada e panelas fumegantes como centros de reuniões familiares. Ali, diz ele, nasceu sua obsessão: contemplar uma panela fervendo como se fosse um ritual.
Embora seja reconhecido hoje nas redes sociais como o chef que documenta o conhecimento culinário de povos esquecidos, José Luis não chegou à cozinha por linhagem ou herança.
Ele conta que, como quase tudo importante em sua vida, chegou por acaso. Era garçom em um restaurante e, um dia, quando um cozinheiro faltou, ofereceu-se para substituí-lo. Ele tinha 17 anos. Nunca mais saiu da cozinha.
"Cozinhar foi a única coisa que aprendi a fazer", diz ele com convicção. E, além disso, ele tem certeza de que é o que ele faz de melhor e o que eu mais gosto.
A carreira profissional de José Luis começou de forma inesperada, chegando à televisão. Ele atuou como diretor culinário de vários reality shows culinários, incluindo MasterChef Colômbia e MasterChef México.
Mas ele sempre teve uma profunda conexão com o campo e a culinária tradicional. Ele a redescobriu enquanto morava em Dubai, cercado por técnicas europeias, mas sem saber fazer um tamale ou uma empanada colombiana.

Preparando diabolinas, uma massa típica de Córdoba. Foto: Cortesia de José Luis.
"Tive que aprender a fazer empanadas enquanto estava nos Emirados Árabes Unidos. Foi aí que percebi que algo estava errado: eu sabia cozinhar comida francesa, mas não sabia fazer a minha própria."
Ele sentiu a necessidade de retornar. Desta vez com um propósito claro: viajar pela Colômbia para aprender, não com livros, mas com a experiência real . Começou em Huila, onde era dono de um restaurante.
Ele aproveitou as segundas e terças-feiras, quando estava fechado, para explorar as aldeias, conversar com as pessoas, coletar histórias, aprender técnicas e voltar com ingredientes locais para transformar em novos pratos.
Desde então, ele não parou mais. Viajou por quase todo o país (faltam apenas três departamentos) e documenta cada viagem com a câmera do celular. Porque para ele, o fogo e as mãos dos camponeses são os protagonistas.

Na foto, José Luis filma a cozinheira Teresita. Foto: cortesia de José Luis.
Nessas jornadas, José Luis encontrou na linguagem audiovisual uma forma de narrar sua identidade. Durante a pandemia, sem trabalho na televisão, comprou equipamentos básicos e começou a dar aulas virtuais de culinária.
O sucesso e o crescimento nas redes sociais foram tantos que o motivaram a continuar. Hoje, seus vídeos acumulam milhares de visualizações e conectam o público urbano com as cozinhas rurais que ainda perduram.
A ideia de documentar o conhecimento popular nem sempre foi vista da forma como é hoje. José conta: "Comecei com fotos feias e vídeos malfeitos. Mas o importante era o que estava sendo contado. As histórias eram impactantes."
Fogões que resistem José Luis não só cozinha, como também constrói pontes. Essas pontes o levaram a colaborar com o Ministério das Relações Exteriores na promoção da Colômbia no exterior e a trabalhar em projetos editoriais junto com instrutores do SENA.
Um deles, Ricardo Malagón, o convidou para documentar as culinárias de Meta, Boyacá e Córdoba para criar livros de receitas que foram indicados e ganharam prêmios internacionais como o Gourmand World Cookbook Awards.
Cada departamento o impactou de forma diferente. Em Córdoba, por exemplo, ele descobriu a comunidade Zenú de San Andrés de Sotavento, onde guardiões de sementes protegem variedades de milho que não aparecem nos mercados.
Na Amazônia, ele se encantou com o tucupi e a mandioca selvagem , cujo conhecimento ancestral só se mantém nas comunidades indígenas. Em Boyacá, as batatas nativas e suas variedades foram uma grande descoberta para ele.
"A Colômbia parece dez países reunidos em um só", diz José com um sorriso. "Há tanto para contar, tanto para proteger. A culinária tradicional está em risco, e se não a documentarmos hoje, amanhã será apenas uma lembrança."
É por isso que ele insiste em fazer isso sem ego, sem holofotes, sem ser o centro das atenções. Seu foco é claro: quem deve brilhar é a mulher que prepara casabé em seu quintal, o fazendeiro que planta pimentões, a avó que ainda assa arepas em brasas. Ele só quer ser um canal.

Foto tirada por José Luis durante sua visita ao departamento de Córdoba. Foto cortesia de José.
Para ele, é importante não "roubar" receitas ou conhecimentos apropriados. Sua intenção é comunicar conhecimentos ancestrais, mas sem perder de vista quem são os criadores e guardiões das culinárias tradicionais.
O fogo como bússola Conversar com José Luis é como seguir o ritmo de alguém que fez da viagem uma forma de estar no mundo. Quando caminha por uma terra, diz que o faz com "fome". Não apenas de comida, mas de histórias, aromas, sons e silêncios.
"Fotografar é olhar a terra com fome", diz ele. E cozinhar é retribuir à terra um pouco do que ela te dá.
Ele diz isso com a paixão de quem já ficou horas em frente ao fogão observando uma panela ferver. Porque, para ele, o fogo não é apenas uma fonte de calor: é um símbolo.
"O lar é memória, resistência, linguagem. E através dele, a Colômbia pode contar sua história", diz ele com um toque de esperança.
Em seus workshops atuais, José Luis ensina jovens chefs e criadores de conteúdo a usar o celular como ferramenta para contar histórias. Ele garante que não é preciso ter uma produtora cara nem um mestrado em comunicação. Tudo o que é preciso, diz ele, é disciplina e coração.

Na foto, Matilde Guerra, cozinheira do reservatório Urrá, em Alto Sinú, Córdoba. Foto: Cortesia de José.
Ele ri e diz que era o pior cozinheiro; sua mãe não o deixava chegar perto da cozinha. Mas, com muito trabalho e prática, ele aprendeu. E também aplicou isso à sua arte de contar histórias.
Hoje, José Luis sonha em criar um serviço de buffet internacional que leve os produtos e histórias das comunidades rurais para outros países.
Ele já cozinhou no Japão, no México e na Europa. Mas quer mais: um palco global para as mãos que ensinam tudo. Para a mulher que compartilhou a receita do wrap com ele. Para o avô que lhe mostrou como moer milho. Para as cozinhas sem teto nem paredes que ele chama de "cozinhas abertas".
Ele deseja que um japonês experimente um wrap e sinta a mesma coisa que ele sentiu quando experimentou o tucupí pela primeira vez: surpresa, alegria e vontade de aprender mais.
Quando perguntado sobre o que mais lhe orgulha, ele não hesita: "Do meu país. Do seu povo. Daqueles que lutam nos territórios. Não do colombiano "vivo", mas daquele que trabalha duro, que persevera. É por isso que prefiro usar minhas redes sociais para eles. Que sejam os protagonistas."
José Luis não se apresenta como um chef, um influenciador ou um pesquisador. Ele se apresenta como um cozinheiro. Alguém que viaja com fome, que ouve mais do que fala, que se deixa hipnotizar pelo fogo de uma panela e que aprendeu a ver o país do seu fogão.
E enquanto houver fogo, mãos que amassam e vozes que contam histórias, José Luis Rivera estará lá: com seu celular, sua faca, seu caderno. Caminhando pela Colômbia para continuar aprendendo sobre as tradições culinárias dos recantos escondidos deste país.
Para saber mais sobre as histórias de José Luis, você pode segui-lo nas redes sociais em @joseluis_cocina.
ANGELA PÁEZ RODRÍGUEZ - ESCOLA DE JORNALISMO MULTIMÍDIA EL TIEMPO.
eltiempo