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Prisão Ketziot – 5.7 no Booking.com

Prisão Ketziot – 5.7 no Booking.com

Depois de ouvir os activistas da flotilha Global Sumud relatarem os maus-tratos a que foram submetidos enquanto estiveram presos em Israel, espero uma reacção firme. O mínimo que se pede é uma mobilização geral para inundar o Booking, o Trivago, o TripAdvisor e qualquer outra plataforma de turismo com duras críticas às más condições em que decorreu esta viagem. Alojamentos sobrelotados? Pouca e má comida? Percevejos? Estalajadeiros brutos e mal educados? Faz-me lembrar o hostel Dragondoss, em Ljubljana, uma espelunca em que fiquei hospedado quando fiz interrail – talvez seja mais correcto dizer “armazenado”. Roubaram-me o sapato esquerdo. O bufê do pequeno-almoço só tinha corn flakes moles. Os percevejos eram tão grandes que tinham mini-percevejos nas suas carapaças.

Naquele tempo não havia internet, caso contrário aqueles meninos teriam ficado com a caixa de comentários assada, tantas as queixas que lá iam entrar. Felizmente, agora há sites especializados e é bom que os activistas deixem as suas críticas, para servir de aviso aos próximos incautos que se inscrevam nesta excursão. “De zero a dez, em que zero é “pouco provável” e dez “muito provável”, recomendaria a experiência Sumud aos seus amigos?” Malta, tudo corrido a zero, por favor. Se ainda for possível, peçam reembolso. Estes operadores turísticos não podem ficar impunes.

A viagem da flotilha é uma espécie de bootcamp mais radical que o costume. O bootcamp é um acampamento onde a burguesia ocidental paga bom dinheiro para, durante uma semana, viver em desconforto, como as tropas especiais em território inimigo. Fazem um bocadinho de detoxing, um bocadinho de juicing, um bocadinho de mindfulness, um bocadinho de fasting, um bocadinho de crossfiting e depois voltam para casa, mais preparados para enfrentar a maçada do dia-a-dia.

Não pretendo desvalorizar as provações por que os activistas passaram. Tudo indica que foram uns dias horríveis. Mas a verdade é que, depois de tudo o que tem sido dito sobre a maldade dos israelitas, comer má comida, ouvir uns gritos e levar uns safanões, não parece assim tão tenebroso. É chato, mas sabe a pouco.

Vendem-nos as IDF como as hordas de Mordor, orcs que matam indiscriminadamente mulheres, crianças, bebés e velhinhos – aliás, não é indiscriminadamente, uma vez que, pelo que nos contam, fazem pontaria de propósito a mulheres, crianças, bebés e velhinhos. Os israelitas, dizem, são fanáticos sanguinolentos que não respeitam os mais básicos direitos humanos e estão a praticar um genocídio sem precedentes, com especial esmero e gozo. Ora, depois de acastelar a perfídia deste Demónio, as queixas dos activistas desiludem. Obviamente, estar preso em celas lotadas, a pão e água, a ser molestado e insultado, é desagradável. Mas, face ao que foi anunciado, é decepcionante. É a alarvidade normal de uma força policial de brutamontes. Nada de extraordinário, nada que distinga os soldados israelitas de outros militares em tempo de guerra. Se o objectivo da flotilha (além da ajuda humanitária que, infelizmente, ficou esquecida no porto de Barcelona) era denunciar a excepcionalidade da violência israelita, então falhou. É apenas violência banal.

Sempre que prestam declarações, os activistas fazem questão de ressalvar que, apesar de terem passado uns dias difíceis, o que os palestinianos vivem em Gaza é muito pior. Para enaltecerem o seu sofrimento, comparam-no à existência de uma população que vive há dois anos em guerra. Face ao calvário em Gaza, o mini-calvário da Sumud. Só que não há comparação entre as duas experiências, o que os palestinianos vivem não é “muito pior”, não é um grau superior do “mau” que os activistas viveram. Trata-se de uma coisa diferente, não pode sequer ser medida na mesma escala. Sugerirem isso é como eu dizer que, apesar do corte de cabelo que o barbeiro me fez ser mau, a decapitação de Maria Antonieta foi muito pior.

observador

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